Sem levedura, sem cerveja


A levedura é um dos quatro insumos indispensáveis para a fabricação de cerveja. No conjunto água, malte, lúpulo e levedura, ela é peça fundamental, tanto para a produção da bebida, quanto para trazer características sensoriais. Sabe aquele belo aroma de cravo e banana de uma Weiss? Trabalho da levedura. A carbonatação, a espuma e até mesmo o sabor, também sofrem influências das leveduras, sem contar, é claro, na produção do álcool na cerveja, que está diretamente ligado ao seu trabalho.

Mas a levedura não é uma só, são vários os tipos, como a Saccharomyces, Brettanomyces e por aí vai. 

Para saber mais sobre esse insumo tão importante para a criação do nosso amado líquido, o Clube do Malte (www.clubedomalte.com.br) - um dos maiores players do mercado craft beer do Brasil, conversou com a Fernanda Fregonesi, Bacharel em Biomedicina, com dupla habilitação para Microbiologia e Patologia clínica e Mestre em Biotecnologia Industrial com enfoque em Biotecnologia Agroalimentar. Antes de terminar sua graduação, o recém-descoberto amor pela cerveja a fez trocar a microbiologia das análises clínicas por uma vaga de estágio onde consolidou o seu interesse em leveduras e fermentação. Ela nos contou tudo sobre suas amadas meninas, as leveduras.


Clube do Malte: Como você começou a trabalhar com leveduras?
Fernanda: Antes de atuar nesse ramo eu trabalhava com microbiologia hospitalar e na época eu comecei a fazer alguns amigos muito suspeitos (risos) e eles acabaram me levando para algumas produções de cervejas, num período em que eles já estavam deixando seus empregos para trabalhar com cerveja, e comecei a pensar que também gostaria muito de trabalhar com isso. Eu via o pessoal trabalhando tão mais feliz e realizado do que eu, foi então que pensei em o que eu sei fazer para que eu pudesse colaborar com essa galera. Logo após eu conheci o Marcelo da Bio4, que é uma empresa de levedura liquida, em Curitiba, e fui logo pedir um estágio para ele. No final da faculdade eu deixei meu emprego fixo e fui estagiar na Bio4 em biotecnologia para cerveja.

Clube do Malte: Nos fale um pouco sobre os seus trabalhos atuais?

Fernanda: Recentemente eu me formei no mestrado em Biotecnologia Agroindustrial, pela Universidade Positivo. Também estou ministrando aulas na pós de gestão e tecnologia da cerveja, da universidade Positivo. Estou com parceria com um laboratório de Franca, para produção de levedura, faço consultoria para cervejarias e também cursos para cervejeiros caseiros pelo Brasil todo.

Clube do Malte: Qual estudo está desenvolvendo no momento e quais os benefícios que isso pode trazer para as produções cervejeiras?
Fernanda: Agora, em parceria com um laboratório, estou produzindo levedura líquida para as cervejarias. Eu gosto muito de trabalhar com leveduras selvagens, acho que sou uma das microbiologistas mais partidárias de fermentações abertas e fermentações selvagens. Algo interessante também é que agora estamos tentando isolar novas leveduras em busca de termos um caráter brasileiro, afinal nós temos no país uma microbiota tão rica e vai que a gente consegue chegar nesse resultado, com um perfil próprio de levedura.


Clube do Malte: Sabemos que a levedura é o que fermenta a cerveja, mas na prática, como isso funciona? Como a levedura entra na produção de cerveja?
Fernanda: A levedura, quando é inoculada no mosto, para sobreviver ela vai consumir os açúcares do mosto, e com essa ação ela quebra a molécula de glicose, maltose, ou maltotriose, esses açúcares que são do malte, e nessa quebra irá degradar ele em álcool e CO2 e é assim que temos a carbonatação e a produção do álcool na cerveja, feita no processo de fermentação.

Clube do Malte: Quais os principais e mais usados tipos de leveduras?
Fernanda: Há três tipos de leveduras que são mais usadas: as leveduras de Ale, a Saccharomyces cerevisiae, que são leveduras de alta fermentação, que trabalham em temperaturas mais altas, produzem mais aromas e são usadas geralmente em IPAs, APAs, ESB e Belgians em geral, entre outros estilos. Temos também as leveduras de Lager, chamadas Saccharomyces calbergensis, que trabalham em temperaturas mais baixas e produzem menos aromas. Outra que também já está sendo bastante usado no Brasil é a Brettanomyces, uma levedura que trabalha em temperatura de Ale e produz uma gama de aromas bem típicos dela. Hoje tem se usado muito a família Brettanomyces aqui no Brasil, principalmente a cepa de Brettanomyces Trois, que produz bastante aroma de abacaxi, algo mais cítrico, e a cepa de Brettanomyces Claussenii, essas duas são as mais boazinhas da família (risos).

Clube do Malte: Com a levedura aparece na cerveja?
Fernanda: Ela aparece muito no aroma da cerveja, toda a produção de ésteres, fenóis, o aroma de cravo e banana em uma Weiss, por exemplo, são subproduto da fermentação, esses tipos de aromas são trabalho das meninas.

Clube do Malte: Para produzir cerveja, qual a diferença entre o fermento líquido e o seco?
Fernanda: Para os cervejeiros iniciantes o mais indicado são as leveduras secas, por que elas têm o manuseio mais fácil, basta reidratar na água quente e colocar no mosto. Já a levedura liquida não, é indispensável seguir alguns processos antes de iniciar a produção da cerveja, é necessário ter maiores cuidados, pode-se dizer que é preciso ter mais técnica microbiológica para trabalhar com elas. Em comparação às leveduras secas, as líquidas têm uma gama enorme de coisas boas, elas produzem mais aromas, deixam a cerveja mais seca e trazem um ganho maior de qualidade do produto.


Clube do Malte: Recentemente você produziu a cerveja Se eu fosse Como Tu, uma colaborativa com a Cervejaria Urbana, poderia nos falar sobre como essa produção?
Fernanda: Quando nós decidimos fazer a cerveja, eu pensei em usar algumas leveduras bem diferentes e nós pegamos um blend de leveduras que um amigo trouxe dos Estados Unidos, mas o blend não ativava por nada e com a data da brasagem chegando pensei e usar algumas das minhas leveduras. Selecionei todas as Brettanomyces que eu tinha no laboratório e usei mais duas leveduras selvagens que eu estava isolando na época e fermentamos a cerveja com zero Saccharomyces. A Se Eu Fosse Como Tu foi um brainstorm de várias coisas que gostávamos em uma cerveja. Ela tem amora, framboesa, blueberry e morango, e vem evoluindo na garrafa, devido ao uso de leveduras de guarda. Com o tempo ela deve evoluir muito ainda.

Clube do Malte: O que você considera mais importante para a evolução cervejeira no Brasil?
Fernanda: Eu acho que vamos passar por um filtro muito grande em relação ao controle de qualidade das cervejarias. Acredito que é preciso, que iremos ter uma peneirada no controle de qualidade, dividindo as boas cervejarias que irão perseverar, das cervejarias ruins. Se tem uma coisa hoje que me deixa louca é a não constância de lote, é o fato de você tomar uma cerveja hoje e ela estar ótima, mas em uma próxima vez estar horrível. Acho que o maior foco deve ser no controle de qualidade.
Sobre Clube do Maltewww.clubedomalte.com.br
Fundada pelo empresário Douglas Salvador, o Clube do Malte é um dos maiores players do mercado craft beer do Brasil. Com 8 mil assinantes ativos em sua base e mais de mil rótulos em seu portfólio, o Clube do Malte acaba de lançar uma nova configuração do seu programa de assinaturas: o SMART. O novo serviço é uma maneira prática e econômica dos assinantes receberem produtos de conveniência (como cosméticos, itens de higiene, perfumaria, snacks etc), no conforto de suas casas, aproveitando o frete do seu Beer Pack.

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